Jesus foi possuído por demônios? Uma resposta ao Fabio Sabino

Novamente, Fabio Sabino alega fazer uma rígida “análise textual” para derivar algo que o texto diz. Neste caso, faz tentativas para afirmar que os textos alegam que Jesus realmente foi possuído por “divindades demoníacas” e discorre de vários argumentos para tal. Vamos respondê-lo por partes.

O texto de Marcos 3,21-22 reza:

Mais uma vez se ajuntou a multidão, de modo que não puderam mais nem sequer tomar uma refeição. Mas, quando os seus parentes ouviram isso, saíram para o pegarem, pois diziam: “Ele perdeu o juízo”.

A frase oi par autou significa literalmente ‘aqueles do lado dele (Jesus)’. Pode significar um outro círculo de discípulos que tinha acabado de chegar e quem sabia das multidões e estirpe do ministério do Galileu, que agora vêm nesta conjuntura especial. Mas a linguagem provavelmente significa parentes e ou a família de Jesus, como é comum na LXX o fato de que em verso 31 sua mãe e seus irmãos são expressamente mencionados, indicando que eles são ‘os amigos aludidos a no verso Mr 3,21.

A expressão ‘os seus’ (ou παρ’ αυτού) pode ser interpretada como ‘apoiadores’ ou ‘parentes’. Esta é a interpretação comum, e é isso que exige o texto do v. 31. Portanto, o v.20, ‘os seus’, ao ouvirem estas notícias, ‘deixaram’ de Nazaré, onde residiam (Mc. 6,1 – 4; Mat_13,54 – 57), pois o v. 31 diz que ‘vieram sua mãe e seus irmãos’. Também admite uma interpretação dupla a outra frase: ‘porque diziam’: eram os parentes que diziam ou se dizia, como um rumor que seus parentes ouviram? Esta interpretação é a mais lógica. Enquanto os parentes estavam em Nazaré, o boato desses eventos os alcança. Por esta razão, ‘pois diziam’ isto Dele, é que vieram a Cafarnaum. O uso da terceira pessoa do plural, como indeterminado, é a forma ordinária em Marcos.
Toda dialética do Sabino se concentra nos pontos da família de Jesus querer prendê-lo porque Ele estava “fora de si”. Sabino alega que esse “fora de si” é sinônimo de “estar endemoniado”. Mas será mesmo? O termo exesto (“está fora de si”) é segundo aoristo ativo indicativo intransitivo. A mesma acusação foi levada contra Paulo (At. 26,24; 2Co 5,13). Certamente Maria não acreditava que Jesus estivesse no poder do Belzebu como os rabinos disseram. Os escribas de Jerusalém estavam tentando desacreditar o poder e o prestígio de Jesus (Mc 3,22). Veja Mt 9,32 -34; Mt 10,25; Mt 12,24′ para o Belzebu e Beelzebul. Como vimos, não era a família de Jesus que dizia que Ele estava fora de si e sim que outros diziam isso, como boato. Maria provavelmente sentia que Jesus estava exausto e desejou levá-lo para casa para evitar a excitação e tensão para poder descansar e se alimentar. Os irmãos não acreditaram até agora nas pretensões e afirmações de Jesus (Jo. 7,5). Herodes Antipas considerou Jesus como João Batista redivivus, os escribas tratam-no como estando endemoniado, até a família e os amigos temiam que Ele ficasse desordenado em consequência da sobretensão. Ele foi um momento crucial de Jesus. A sua família ou os amigos vieram para levá-lo para casa, para o pegarem (krathsai), forçosamente se necessário.

O que se dizia sobre Jesus é literalmente que Ele ‘estava fora de si’ (εζεστη). Este verbo usado aqui significa, em outras passagens de Marcos, como estar fora de por admiração, surpresa ou entusiasmo para algo (Mr. 2,12; Mr. 5,42; Mr. 6,51). Portanto, esta palavra não significa que o consideram ‘louco’, como verte a Vulgata: em furorem versus. Ao se unir este versículo intimamente com o anterior, o valor desta palavra é visto em seu próprio contexto. A atividade apostólica de Cristo e o seu zelo para ensinar as pessoas, que se aglomeravam diante Dele e para lhes fazer favores, não lhes dava nem tempo para ‘comer’. Ao que parece, modo humano, era um excesso de apostolado; Mas esta era a sua missão (Jo. 4,31-34). Os parentes vieram para convencê-lo e a forçá-lo a ir com eles: literalmente, vieram para apoderarem-se dele (χρατησαι αυτόν). Mas o verbo usado admite vários sentidos, especialmente este exigido pelo contexto. A notícia desta grande atividade apostólica de Cristo e também a doutrina que expôs, como fez em outras ocasiões (Jo. 10,19-21), talvez exagerada e distorcida pelo rumor popular, chega a seus parentes em Nazaré, e, temendo por sua saúde, vão para Cafarnaum (Mc. 2,1) para influenciá-lo e forçá-lo a ir com eles e fazer uma pausa (Mc. 6,30). Nada que denotasse “louco” por “possessão maligna”, como alega o Sabino.

Devemos analisar alguns motivos pelos quais se dizia que Jesus “estava fora si”:
– Ele deixou um próspero negócio para se tornar pregador itinerante;
– Os líderes religiosos e políticos conspiraram para assassiná-lo, mas ele não recuou (Mc. 3,6). Eles estavam com medo por causa de Jesus.
– Grandes multidões começaram a seguir Jesus, e eles sabiam como tal fama e atenção e celebridade podem subir para a cabeça de alguém (Mc. 3,7-8).
– Ele mostrou grande poder espiritual e um ministério que nunca realmente tinha mostrado no início da sua vida (Mc. 3,9-11). Mesmo sua família não tinha consciência de Sua missão e divindade.

Sabino continua com sua diatribe exagerada dizendo que “Jesus estava possuído pelo capiroto” e tentaram pegá-lo “à força”. Como vimos, de acordo com o texto e corretamente entendido, não é nada disso que quer dizer. Sabino força o texto segundo aquilo que não quer dizer. Alguns intérpretes pensam que os parentes de Jesus o consideraram possesso, de modo que o v. 21b diz a mesma coisa que os v. 30 ou 22 (Baumbach, p 32s; Haenchen, p 140). Mas esta equiparação dificilmente procede. O que une a família aos professores da lei é a incredulidade, não a inimizade. Eles queriam salvá-lo, não matá-lo. Outros intérpretes entendem o v. 21 como um diagnóstico de doença mental ou loucura. No entendimento judaico, estas também podiam ser causadas por demônios – de
acordo com Bill. IV, 523.25, os judeus conheciam um “espírito da loucura” – mas seria uma possessão de grau menor. Nesta interpretação, Jesus seria levado como um paciente e isolado. Mas isto não combina com o quadro testificado da manifestação de Jesus. Ele não se apresentava como um extático ou enlouquecido; cf. a descrição da loucura em 1Sm 21.14ss. Stauffer oferece uma variação desta interpretação (p 69). Na verdade a família não se importava com a saúde de Jesus, mas observara a tensão política entre ele e Jerusalém e viam com preocupação que ele não se impunha reservas nem neste estágio, antes cambaleava como um cego para os braços dos seus inimigos. “Aí sua mãe tem a idéia desesperada de declarar Jesus inimputável, para assim salvar a ele bem como todos os seus parentes e amigos.” Neste caso o v. 21 significa: eles começaram a circular esta versão. Mas isto nos parece ser bastante fantasioso. A interpretação tenta mostrar o que o próprio contexto nos indica.

O verbo exhistamai, que aqui não pode ter simplesmente seu sentido comum, é difícil de definir nestas circunstâncias. Mateus e Lucas não ajudam, porque deixaram de fora este pequeno trecho da tradição. Esclarecedor, porém, é o paralelo detalhado em At 26,24. O rei Agripa fica sob o poder espiritual do discurso de Paulo a ponto de a fé germinar nele, e ele está na iminência de tornar-se cristão. O procurador Festo só consegue evitá-lo rasgando o ar com uma exclamação veemente. No grego ele só diz uma palavra, além do vocativo: “Deliras!” A palavra usada, mainomai, na literatura muitas vezes tem o mesmo sentido de exhistamai. O que ela significa no contexto? Será que Festo afirmava que Paulo estava em êxtase? Mas Paulo não espumava pela boca nem tinha o olhar distante dos fanáticos. Sem ser rebatido, ele pode responder que está consciente, dizendo “palavras de bom senso”. Será que Festo queria declará-lo débil mental? Isto também é duvidoso, pois na sequência ele lhe atesta uma erudição impressionante. É loucura de Sabino alegar que os parentes de Jesus pensavam que ele estava possesso.

Depois, Sabino alega que deisidaimoniav em At. 25,19 deve ser traduzido como “religião” e afirma que religião tem ligação com a palavra “demônio”. Bad translation. Um termo mais correto aqui seria “adoração da deidade” (Lit.: “pavor dos demônios”. Gr.: dei·si·dai·mo·ní·as; lat.: su·per·sti·ti·ó·ne; J17,18: “serviço de seu Deus”. Veja 17:22 n.). Aqui não tem o senso de religião (religare) no sentido estrito. Comentando esta palavra composta, F. F. Bruce observa: “O contexto tem de decidir se esta palavra é usada no seu sentido melhor ou pior. De fato, era tão vaga como ‘religiosos’ em ingl[ês], e aqui seria melhor traduzida por ‘muito religiosos’. Mas o ‘supersticiosos’ da AV [Versão Autorizada, em inglês] não é inteiramente errado; para Paulo, a religião deles era mormente supersticiosa, como também era, embora por outros motivos, para os epicureus.” — The Acts of the Apostles (Os Atos dos Apóstolos), 1970, p. 335.

Jo. 8,51 – Naturalmente, Jesus não quer dizer que todos os que o seguem nunca provarão a morte literal. Antes, o que quer dizer é que eles nunca sofrerão a danação eterna, ou a “segunda morte”, da qual não há ressurreição. Θεωρεῖν θάν., como γεύεσθαι θαν., é um hebraísmo para morrer, e não deve ser pressionado para dizer, ‘não sentirá (a amargura da) morte,’ no sentido temporal, como tem sido entendido por Stier (iv. 433, edn. 2). A morte do corpo não é reconhecida como a morte, mais do que a vida do corpo é vida, nos discursos do nosso Senhor: ver c. Jo. 11,25-26 e notas. Ambas as palavras têm um significado mais profundo. Ou seja, o “professor” (sic) Fabio Sabino, não sabe que aqui Jesus usou de um hebraísmo (“verá a morte”. V. Sl. 89,48). Jesus fala de morte espiritual, não morte física.

A diferença entre Mt. 16,22 e Jo. 8,51 é que neste Jesus usa um hebraísmo (yanaton ou mh yewrhsh eiv ton aiona, algo de que o “professor” Fabio Sabino de forma ladina omite). É vergonhoso para alguém que se diz “professor” fazer uma análise tão banal e supérflua de um texto desses.

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