Conceitos de lógica formal, ideia e termo

braincodeA ideia, última subdivisão do raciocínio, constitui por isso o ponto de partida da Lógica Formal; também chamada conceito, é a simples representação intelectual de uma coisa. Simples, porque a ideia representa uma coisa, sem nada afirmar ou negar; é tão somente representação. Diz-se ainda de a ideia ser representação intelectual, pira a distinguir da imagem. A ideia é universal porque se aplica a muitos, é imaterial, enquanto que a imagem é de um só, é singular e cercada de condições materiais. Por exemplo, “homem” é uma ideia; de Pedro, tenho imagem.

Termo é a expressão verbal (o sinal) da ideia; é diferente de palavra; por exemplo, o termo “alguns homens” é composto de duas palavras. O termo é o revelador exterior, o sinal que manifesta a ideia assim como a ideia por sua vez é o revelador, o meio pelo qual se conhece a essência das coisas exteriores. Do mesmo modo que a bandeira é sinal da pátria, o termo é sinal da ideia.

O termo é sinal convencional, pois se desde o começo se tivesse, por exemplo, dado à palavra “livro” o nome “elefante”, ninguém sorriria ao se chamar o “livro” de “elefante” e vice-versa. Todavia, é convencional apenas o fato de o homem dar tal nome a tal coisa, mas não a tendência que o homem possui de se servir de termos para manifestar os conceitos de seu espírito, o que é natural.

Da relação entre ideia e termo, e também das relações entre juízo e proposição, entre raciocínio e argumentação, decorre o nexo íntimo e necessário entre Lógica e Gramática, sem em nada comprometer a autonomia de ambas as ciências.

Nesta ideia “homem” pode-se considerar o número de homens que ela abrange; é a extensão. Portanto, a extensão da ideia é o número de indivíduos que ela abrange.

Mas também, nesta mesma ideia “homem’,’ pode a pessoa focalizar, não a quantidade de indivíduos, mas sim as qualidades nela contidas: racionalidade, animalidade, risibilidade, etc. É a compreensão da ideia “homem”. Portanto, a compreensão da ideia é o conjunto de qualidades por ela abrangidas.

É natural que quanto maior for a compreensão, tanto menor será a extensão. Assim, a ideia “homem” abrange todos os homens; já a ideia “brasileiro”, que é homem natural do Brasil, abrange só alguns homens, pois nem todos os homens são brasileiros. Por conseguinte, a extensão da ideia “homem” (todos) é maior que a de brasileiro (alguns homens); mas a compreensão da ideia “homem” (animalidade e racionalidade) é menor que a de brasileiro (animalidade + racionalidade+ natural do Brasil).

Definir é dizer tudo o que uma coisa é, sem nada poder lhe ser acrescentado ou tirado. A definição pode ser nominal, se só explica o termo; por exemplo, explicar o peixe chamado “pirapitanga” pelo nome, isto é, pela etimologia que quer dizer: “pirá” = peixe + “pitanga” = vermelho. Será definição real se disser o que é a coisa em si mesma, subdividindo-se por sua vez em essencial, se der a essência: homem é o animal racional; descritiva, se só se limitar a oferecer caracteres exteriores: homem é o ente composto de braços, pernas, etc.; causal, se definir só pela causa que faz: homem é o ente cuja alma é criada imediatamente por Deus\ final, se definir pela causa final, homem é o ente criado para ser feliz. Das diversas definições a mais perfeita é a essencial.

Divisão é a decomposição de um todo em seus elementos. Divisão da ideia: quanto à extensão, a ideia pode ser universal (abrange a todos indivíduos); particular (alguns) e singular (só a um). Ressalva notar que, do singular, se tem imagem e, neste sentido, não há ideia do singular. Mas, no singular, a inteligência pode considerar só a essência, a ideia que ele encarna em si, e neste sentido o singular é também ideia. Assim a noção de essência, em sentido lato, deve ser estendida até aos objetos singulares.

Quanto à compreensão, a ideia pode ser abstrata,é só a qualidade sem o sujeito: sabedoria; ou concreta, a qualidade com o sujeito: sábio. Positiva, é entidade ou perfeição: bondade, visão; ou negativa, é a ausência de entidade, de perfeição: maldade, cegueira. Direta, também chamada universal metafísico, é a ideia real, o conceito mental: homem; ou reflexa, chamada universal lógico, é a ideia lógica, ente de razão; por exemplo, a ideia “humanidade” enquanto é tomada como objeto de reflexão. Vê-se um homem, mas ninguém jamais viu a humanidade passear por um jardim. O universal direto é ente real, é objeto da Metafísica; existe na mente humana e no mundo exterior: a ideia “homem” que está na inteligência, também se encontra em Paulo, ainda que o modo de estar seja diferente: universal na inteligência e singular em Paulo. O universal reflexo, pelo contrário, é ente de razão, é objeto da Lógica, só existe na inteligência humana. Confundir o universal direto com o universal reflexo é confundir a Metafísica com a Lógica, ou melhor, é acabar com a Metafísica, o coração da Filosofia.

Por outras palavras, o universal metafísico é abstraído da realidade, conotando consigo: 19) um conhecimento implícito de si mesmo; 29) um conhecimento implícito das condições individuais e próprias de cada indivíduo. Por isso, encontra-se ele em todos os indivíduos dotados da mesma essência e em cada um deles a seu modo. Todavia, não há nenhuma comparação expressa e explícita com os indivíduos contidos no universal metafísico; isto já é exclusivo do universal lógico, por causa disso mesmo, chamado também universal reflexo.

O universal lógico, oriundo da reflexão da inteligência sobre o universal metafísico, traz consigo uma comparação explícita e expressa da essência (universal metafísico) com cada indivíduo contido nesta mesma essência;por exemplo, ao dizer a frase :“Pedro é homem”, comparei anteriormente a essência “homem” (universal metafísico) com “Pedro” e após ver a conveniência entre ambos, disse: “Pedro é homem”. A relação que coloquei entre “Pedro” e “homem” é relação de razão, porque existe somente em minha razão; ela existe e subsiste só em minha inteligência. Como pode referir-se a cada um dos indivíduos da mesma espécie, a ideia “homem” é universal reflexo, relação de razão, um ente lógico. 0 universal lógico aplica-se a todos os indivíduos contidos em si, mas contrariamente ao que sucede com o universal metafísico, aplica-se a todos e a cada um sempre no mesmo sentido. 0 metafísico aplica-se a todos, mas a cada um a seu modo.

Mais uma vez, o universal metafísico é objeto da Metafísica; o universal lógico é objeto da Lógica. Confundir um com outro é confundir a Metafísica com a Lógica, ou melhor,equivale a acabar com a Metafísica, erro esse introduzido na educação brasileira pela Reforma do Marquês de Pombal (4).

Quanto ao modo de significar, a ideia é unívoca quando se aplica a muitos sempre no mesmo sentido. Unívocas são todas as ideias lógicas, isto é, as ideias universais reflexas. Ora, todas as ideias lógicas se reduzem a cinco grupos, chamados predicáveis ou categorias: 1) espécie; 2) gênero; 3) diferença; 4) propriedade; 5) acidente.

A espécie é a ideia universal reflexa que representa a essência completa de muitos indivíduos; exemplo: humanidade. O gênero é ideia universal reflexa que exprime o elemento essencial comum a espécies diversas; “animalidade” é gênero comum ao homem e ao animal irracional. A diferença, chamada específica, é a ideia universal reflexa que representa o elemento essencial próprio de cada espécie: “racionalidade” no homem. O gênero próximo e a diferença específica vão dar a espécie, a essência; por isso, toda definição essencial deve ser composta de gênero próximo e de diferença específica. A propriedade é a ideia universal reflexa representativa da qualidade que necessariamente emana da essência: “risibilidade” no homem. O acidente (lógico) é a ideia universal reflexa representativa de uma qualidade que indiferentemente pode ou não existir num sujeito: “bondade” no homem.

Equivoco se diz do termo, não dá ideia que o não pode ser, enquanto se aplica a sujeitos em sentidos completamente diferentes: “Leão” aplicado ao animal, à constelação e ao homem (nome próprio). Análogo é o termo ou a ideia que não é nem o idêntico, nem o disparatado mas o semelhante-dissemelhante. Distingue-se na analogia filosófica, a analogia de atribuição que representa a idéia que convém intrínseca e principalmente a um só ente (analogado principal) e aos outros (analogados secundários) extrinsecamente e somente enquanto se referem ao primeiro: a “saúde” convém intrinsecamente ao animal (analogado principal) ao passo que o alimento e o clima são sadios (têm saúde) enquanto se referem à saúde do animal causando-a e só. Além da analogia de atribuição, também existe a analogia de proporcionalidade imprópria ou metafórica, quando os termos ou ideias são semelhantes na operação. A analogia: “Aquiles é um leão” equivale a

leão                     Aquiles
_______  =  _______

coragem           coragem

O sinal de igualdade ( = ), aqui, coragem coragem significa semelhança na “operação” característica do leão. Esta analogia é chamada de proporcionalidade: existem duas comparações; mas de proporcionalidade imprópria, pois formalmente o leão só existe num sujeito, no animal; na realidade, Aquiles nunca foi e nem é leão. Pelo contrário, na analogia de proporcionalidade própria, a rainha das analogias, a ideia está intrínseca e formalmente em todos e em cada um, a seu modo. É semelhança de relação e não semelhança de ideias. Assim quando se aplica o termo ou a ideia ente a Deus e à criatura, não se diz diretamente que o ente humano é semelhante ao ente divino: isto seria “semelhança” de perfeição e não “semelhança de relação”; mas, antes de tudo, afirma-se que a relação ente-Deus é “semelhante à relação” ente-criatura. Assim pela analogia de proporcionalidade própria, a ideia ente encontra-se em Pedro, em Deus, neste livro e em tudo. Mas, em Pedro, ela tem uma compreensão; em Deus, outra; neste livro, outra; enfim, ela está em tudo, mas em cada coisa a seu modo:
Deus

… = Deus           Pedro     este livro       esta pedra
______ = – _____ =  _____   =   _____ = …
ente             ente            ente             ente

BIBLIOGRAFIA
AQUINO, Santo Tomás de. In Peri Hermeneias. Turim-Roma, Marietti, 1955. liber I, caput I-III.
ARISTÓTELES. Les Seconds Analytiques. In:-. Organon. Paris, Vrin, 1936. v. IV, livre II. -. De L’Interprétation. In:- . Organon. Paris, Vrin, 1936. v. I, chapitres 1-2. p. 77-80.
CAIETANUS, Thomas de. De Nominum Analogia. Roma, Institutum An-gelicum, 1934.
MARITAIN, Jacques. Lógica Menor. Trad. bras. Rio de Janeiro, Agir, 1958. -. Sept Leçons sur L’Être. 2. ed. Paris, Téqui, s. d.
PENIDO, M. Teixeira – Leite. A Função da Analogia em Teologia Dogmática. Trad. bras. Petrópolis, Vozes, 1946.
TOMÁS, João de Santo. Logica. In:-. Cursus Philosophicus Thomisticus. Turim-Roma, Marietti, 1948. v. II, pars II, articuU XIII-XIV.

Fonte: Iniciação à filosofia, de José Antonio Tobias (Editora da UNOESTE)

Deixe uma resposta

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.