“EU DIRIJO!” Esta declaração pode não impressioná-lo, mas teve um profundo efeito sobre mim. O homem de 50 anos que falou isso estava no chão, na minha frente. Por ter contraído poliomielite quando bebê, as pernas dele ficaram atrofiadas: pequenas e inválidas, elas ficavam cruzadas sob o seu corpo. Apesar disso, os braços e ombros eram fortes e desenvolvidos, devido a anos de locomoção apoiando-se nas mãos. E a sua completa falta de comiseração me envergonhou: especialmente a felicidade que demonstrou na voz quando me falou com orgulho que dirigia.
Eu também contraí poliomielite, e isso aos 28 anos de idade. Fiquei arrasado ao saber que não mais poderia andar sem muletas. As palavras simples daquele homem me ajudaram a lidar com a minha depressão. Raciocinei comigo mesmo que se ele, com um grau de deficiência maior do que o meu, não se deixava vencer pela sua condição, por que eu não poderia fazer o mesmo? Decidi ali mesmo que voltaria a dirigir.
Uma tarefa nada fácil
Isso foi quase 40 anos atrás. Naquele tempo, o deficiente precisava ter muita coragem para dirigir. Meu carro adaptado era uma engenhoca e tanto. Uma muleta era afixada sob a minha axila esquerda para alcançar o pedal de embreagem. Eu acionava a embreagem movendo o meu ombro esquerdo para a frente. O acelerador era uma alavanca operada à mão, tirada de um antigo Ford-bigode, e o freio também era operado por uma alavanca manual. Consegue imaginar-me ao volante? Eu movia o ombro para frente e para trás, a mão esquerda segurava o volante e freava, e a direita também segurava o volante, acelerava, e dava sinal. (Na Austrália, os carros mantêm-se à esquerda.) Os carros, naquele tempo, não tinham pisca-pisca.
Ainda bem que dirigir com aqueles dispositivos desajeitados é coisa do passado. Hoje, com transmissão automática e pisca-pisca ao alcance dos dedos, é bem mais fácil dirigir. Graças aos avanços tecnológicos, são muitos os deficientes que dirigem.
Minhas recomendações pessoais
Se você é deficiente e pensa em adaptar um automóvel para poder dirigir, a minha recomendação é que procure um especialista no assunto. Ele poderá providenciar a inspeção de todos os acessórios para proporcionar segurança a você, o motorista, e também aos que viajarem com você. Em vista da possibilidade de acidentes, é importante que tenha um seguro total de uma seguradora reconhecida.
Em geral, por precaução é sempre bom viajar acompanhado. Um antigo provérbio avisa com prudência: “É melhor haver dois do que um porque duas pessoas trabalhando juntas [podem ser mais eficientes, Today’s English Version]. Se uma delas cai, a outra a ajuda a se levantar. Mas, se alguém está sozinho e cai, fica em má situação porque não tem ninguém que o ajude a se levantar.” (Eclesiastes 4,9-10, A Bíblia na Linguagem de Hoje) Um acompanhante poderá ser de grande ajuda em caso de acidente, quando dá problema no motor, ou quando fura um pneu. Alguns motoristas deficientes têm um telefone celular no carro. Assim podem dirigir mais tranqüilos quando não estão acompanhados.
Em países onde existe este serviço, convém que o motorista deficiente se afilie a um serviço de socorro de autos, de modo que possa conseguir ajuda rápida, de dia ou de noite. A taxa anual geralmente não é muito alta: um preço módico, se comparado à tranqüilidade que pode lhe proporcionar.
Nem é preciso mencionar que nós, motoristas deficientes, devemos reconhecer nossas limitações e dirigir de acordo. Não precisamos dirigir agressivamente para provar que podemos dirigir tão bem quanto os demais. Pelo contrário, em alguns países, muitos motoristas deficientes exibem um letreiro no veículo com os dizeres: “Atenção: motorista deficiente físico”, ou algo similar. Isso é apenas um aviso de que o motorista deficiente, por precaução, talvez dirija um pouco mais devagar do que os outros. Não quer dizer que os outros devam manter-se longe dele. Na verdade, posso dizer por experiência própria que uma pessoa deficiente dificilmente demora mais para frear do que um motorista normal, em especial desde o advento dos acessórios modernos.
Dirigir ou não dirigir: decida com responsabilidade
Se você é deficiente e gostaria de dirigir, deve encarar o assunto com a maior seriedade. Primeiro, consulte o seu médico e a família. Pense também no seguinte: Preciso mesmo dirigir? Estou preparado para um possível acidente? Posso superar quaisquer temores que tenha? Quais são as vantagens? Será que dirigir possibilitará que eu volte ao mercado de trabalho? Poderia ajudar-me a ter mais contato com as pessoas?
É importante também saber quando parar. Vem o dia em que todo motorista, deficiente ou não, devido à diminuição da capacidade de decisão, e os reflexos se tornarem mais lentos, precisa tomar tal decisão. Quando esse dia chegar para você, lembre-se de que precisa pensar não só em si mesmo, mas também nos outros: aqueles a quem ama, a família, seu próximo, seu colega na estrada. Será que a sua deficiência os colocaria em risco?
Em alguns países, como a minha terra natal, a Austrália, o motorista deficiente com idade acima de 65 anos só pode renovar a carteira por um ano de cada vez, e isso depois de obter atestado médico, que comprove que ele não tem outros problemas de saúde que comprometam ainda mais o seu desempenho ao volante.
Como os carros são adaptados para os deficientes físicos
A MAIORIA dos motoristas deficientes realiza com as mãos o que não pode fazer com os pés. Existe um tipo de controle manual bastante prático: uma alavanca afixada debaixo do volante, que se projeta da coluna de direção. Da alavanca sai uma haste de aço acoplada ao pedal de freio. Para frear, é só empurrar a alavanca para a frente.
Essa mesma alavanca tem um cabo acoplado ao acelerador. A alavanca se move em duas direções: para frente para frear e para cima para acelerar. Requer pouca força. Uma grande vantagem desse tipo de controle manual é que outros motoristas podem dirigir o mesmo veículo normalmente, sem nenhum problema. Ademais, a alavanca pode ser facilmente tirada e instalada em outros carros.
Para os que têm pouca força nas mãos, existe uma variação neste modelo de controle manual. Ele funciona de modo similar, com movimento para a frente para frear, mas empurrando para baixo para acelerar, de modo que só o peso da mão já aciona o acelerador.
E a cadeira de rodas?
Existe mais um problema com que se confronta o motorista deficiente: o que deve fazer com a cadeira de rodas? Muitos motoristas mais jovens compram sedãs de duas portas que lhes permitem erguer a cadeira de rodas e colocá-la no espaço atrás do assento do motorista. Isso, naturalmente, requer bastante força nos braços e nos ombros. Os que não têm tanta força precisam esperar que um transeunte amigável coloque a cadeira no veículo.
Uma alternativa é o bagageiro externo para a cadeira de rodas, uma grande caixa de fibra de vidro, afixada na capota do carro. Ao toque de um botão, um motorzinho apruma a caixa na posição vertical, de forma que a cadeira de rodas possa ser içada por meio de polias e colocada dentro da caixa. Feito isso, a caixa volta à sua posição original. Um modelo de bagageiro disponível na Austrália pode ser conectado convenientemente no acendedor de cigarros do carro.
Uma desvantagem do bagageiro para cadeira de rodas é que a resistência ao vento é maior, o que aumenta o consumo de combustível em 15% a 20%. Além disso, o custo do equipamento em si já desanima. Mesmo assim, muitos consideram que esses equipamentos valem a pena por causa da independência que proporcionam. Uma mulher deficiente comentou: “Agora posso ir a qualquer lugar sozinha. Não preciso ter sempre alguém para me acompanhar, ou para me ajudar a descer quando chego ao destino.”
Condensado e adaptado de revistas cristãs por Emerson de Oliveira