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Rush Limbaugh não entendeu o papa Francisco

popeandrushEm um segmento recente em seu programa de rádio nacionalmente sindicalizado, Rush Limbaugh falou sobre nova exortação apostólica do papa, a Evangelii Gaudium (A Alegria dos Evangelhos). Eu não tenho espaço para abordar tudo o que Limbaugh disse, mas o que me impressionou foi a sua descaracterização dos comentários do Papa Francisco sobre economia.

O problema fundamental foi que Limbaugh escolheu citar não o que o Papa Francisco escreveu, mas um artigo do Washington Post sobre a exortação, que declarou:

O Papa Francisco atacou o capitalismo irrestrito como “uma nova tirania” e implorou aos líderes globais para combater a pobreza e a desigualdade crescente, em um documento na terça-feira que estabelece uma plataforma para seu papado e conclamou para uma renovação da Igreja Católica… Nele, Francisco foi mais longe do que nos comentários anteriores, criticando o sistema econômico global, atacando a “idolatria do dinheiro.”

Limbaugh respondeu dizendo: “Este é apenas o marxismo puro que sai da boca do papa. Capitalismo desenfreado? Isso não existe em nenhum lugar. ‘Capitalismo sem restrições’ é uma frase socialista liberal para descrever os Estados Unidos”.

Camarada Francisco?
É verdade que se levam horas para ler este documento maciço, mas, para alguém cujas palavras são ouvidas por milhões de pessoas, antes de chamar o papa de um “marxista”, um uso simples das teclas control+F teria esclarecido muita coisa.
Se Limbaugh tivesse feito isso, ele teria descoberto que a frase “capitalismo desenfreado” não aparece na Evangelii Gaudium.

A economia global nem é o tema principal desta exortação; ao contrário, ela é apenas uma área onde o Papa Francisco está convidando a Igreja para evangelizar o mundo. Ele descreve os desafios financeiros e culturais específicos que enfrentam a comunidade humana e, em seguida, aborda as tentações que os pastores têm de enfrentar esses desafios. Em nenhum lugar o Papa culpa as desgraças da humanidade sobre o conceito do livre mercado ou exige um governo marxista para salvar a humanidade.

A traição de João Paulo II?
Limbaugh disse mais tarde: “Justapondo-se contra as ações do Papa João Paulo II, este papa e as coisas que ele recentemente divulgou ontem são realmente impressionantes.”

Não, elas não são. Em sua encíclica Centesimus Annus de 1991, o Papa João Paulo II refletiu sobre socialismo e capitalismo, à luz da recente queda da União Soviética. Embora reconheça que o lucro tem um “papel legítimo” na função de um negócio e que “a solução marxista” a desigualdade econômica havia falhado, ele também falou sobre as “insuficiências do capitalismo” e disse que o lucro não o único indicador que um negócio está indo bem. A dignidade humana dos trabalhadores importa muito, e se o capitalismo é deixado sem controle torna-se “cruel” e leva à “exploração desumana.” As palavras do Papa Francisco são consistentes com João Paulo.

Limbaugh continuou:

Você fala sobre irrestrições, este é um ditame anti-capitalista sem restrições do Papa Francisco. E ouça isso. Esta é uma citação real do que ele escreveu. “A cultura da prosperidade nos enfraquece. Estamos muito contentes se o mercado nos oferece algo novo para comprar. Entretanto, todas aquelas vidas atrofiadas por falta de oportunidade parecem um mero espetáculo. Elas não conseguem nos mover”. Quero dizer, isso é muito profundo. Essa é a maneira de ir além das questões que são éticas. Isso é quase uma declaração sobre quem deve controlar os mercados financeiros. Ele diz que a economia global precisa de controle do governo.

Mas o Papa não está dizendo isso. Ele está dizendo que a economia global precisa de controle global, não do controle do governo na forma de algum assustador governo mundial que cobre tudo. O Papa Francisco disse: “Se queremos realmente alcançar uma economia mundial saudável, o que é necessário neste momento da história é uma forma mais eficiente com a qual devemos interagir e que, com o devido respeito pela soberania de cada nação [grifo nosso], garanta o econômico bem-estar de todos os países, e não apenas de alguns (206)”.

Uma questão complexa
A Igreja ensina que a dignidade da pessoa humana e da gestão das economias globais é mais complexa do que apenas escolher o “capitalismo” sobre “o socialismo/comunismo”. O que é necessário é uma abordagem que respeita a liberdade individual, sem permitir que a liberdade para se torne um monstro que tudo consome e que espezinha os fracos e pobres.

Em Centesimus Annus, o Papa João Paulo II foi perguntado se o capitalismo deve ser o modelo econômico dominante, à luz da queda da URSS. Sua resposta é perspicaz, e eu acho que é uma excelente paralelo à atitude do Papa Francisco sobre o assunto. O Papa João Paulo II disse:

A resposta apresenta-se obviamente complexa. Se por «capitalismo» se indica um sistema económico que reconhece o papel fundamental e positivo da empresa, do mercado, da propriedade privada e da consequente responsabilidade pelos meios de produção, da livre criatividade humana no sector da economia, a resposta é certamente positiva, embora talvez fosse mais apropriado falar de «economia de empresa», ou de «economia de mercado», ou simplesmente de «economia livre». Mas se por «capitalismo» se entende um sistema onde a liberdade no sector da economia não está enquadrada num sólido contexto jurídico que a coloque ao serviço da liberdade humana integral e a considere como uma particular dimensão desta liberdade, cujo centro seja ético e religioso, então a resposta é sem dúvida negativa.

A realidade é que a Igreja Católica e o Papa Francisco não podem simplesmente dizer que são a favor ou contra o capitalismo. É uma questão complexa. Enquanto o Washington Post disse que o Papa Francisco emitiu um “ensino decididamente populista”, o Papa na Evangelii Gaudium mostrou que ele não estava defendendo “um populismo irresponsável”, ou uma solução que, ingenuamente, coloca os pobres contra os ricos (204).

Por outro lado, enquanto o Papa poderia concordar com Limbaugh que “a mão invisível” de Adam Smith pode ​​levantar algumas pessoas da pobreza, ela também pode estrangular a vida dos pobres, e assim diz o Papa no mesmo parágrafo que pudermos não confiar mais no mercado por si só para garantir que todas as pessoas sejam tratadas com dignidade.

No fechamento, eu acho que o seguinte parágrafo de exortação do Papa é algo que deve ser enviado para Limbaugh e talvez possa diminuir o calor um pouco:

Se alguém se sente ofendido por minhas palavras, eu responderia que eu falo com carinho e com a melhor das intenções, independentemente de qualquer interesse pessoal ou ideologia política. Minhas palavras não são as de um inimigo ou um adversário. Estou interessado apenas em ajudar aqueles que estão presos a uma mentalidade individualista, indiferente e egocêntrica para serem liberados a partir dessas cadeias indignas e para alcançar uma maneira de viver e pensar que é mais humana, nobre e fecunda, e que trará dignidade a sua presença nesta terra (208).

Fonte: http://www.catholic.com/blog/trent-horn/rush-limbaugh-doesnt-get-pope-francis
Tradução: Emerson de Oliveira

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