Alegação 1: O cristianismo começou com uma visão de Pedro e Paulo modificou essa visão permitindo a entrada de gentios sem a necessidade de conversão ao Judaísmo.
- Refutação: A alegação de que o cristianismo começou exclusivamente com uma visão de Pedro e foi posteriormente modificado por Paulo simplifica a complexidade da origem do movimento cristão. Fontes como Bart Ehrman e E.P. Sanders, em seus estudos sobre o Novo Testamento e os primórdios do cristianismo, demonstram que o cristianismo foi um movimento multifacetado desde o início. Várias correntes de pensamento coexistiam, com Pedro e Paulo representando diferentes abordagens para a propagação da mensagem de Jesus. A afirmação de que Paulo “dominou” o movimento cristão ignora o fato de que havia uma rica diversidade teológica dentro do cristianismo primitivo, incluindo comunidades lideradas por outros apóstolos, como Tiago, o irmão de Jesus (veja “Jesus and Judaism” de E.P. Sanders).
A ideia de que a experiência de Pedro pode ser reduzida a uma visão ou sonho similar às tradições pagãs ignora o contexto específico das fontes cristãs e a diferenciação entre essas experiências e visões comuns. O Novo Testamento, particularmente nas cartas de Paulo, enfatiza que as experiências de Pedro e dos outros apóstolos não eram meramente sonhos, mas interações físicas e visuais com o Cristo ressuscitado. Em 1 Coríntios 15:5-8, Paulo lista testemunhas específicas da ressurreição, diferenciando isso de meras alucinações ou visões espirituais. Conforme Craig Keener, a cultura judaica do século I teria interpretado as aparições de Jesus como reais devido à natureza tangível das experiências relatadas pelos apóstolos .
Alegação 2: Visões e revelações eram comuns na época, tanto entre cristãos quanto em outras religiões, e o cristianismo se encaixa nesse padrão.
- Refutação: Embora visões e revelações fossem, de fato, uma característica comum em várias tradições religiosas do Mediterrâneo antigo, isso não significa que o cristianismo possa ser reduzido a um fenômeno de visões coletivas ou ilusões. Larry Hurtado, em seu estudo sobre o cristianismo primitivo (“Lord Jesus Christ: Devotion to Jesus in Earliest Christianity”), destaca que a adoração a Jesus como uma figura divina ocorreu muito cedo na tradição cristã e foi baseada em eventos históricos significativos, como a crucificação e a crença na ressurreição, testemunhada por muitos seguidores. O surgimento do cristianismo não pode ser simplesmente explicado como uma questão de “visões” isoladas, mas deve ser compreendido no contexto de um movimento baseado em eventos históricos concretos.
Alegação 3: É possível que uma seita judaica já tivesse previsto o surgimento de algo como o cristianismo, antes mesmo de Pedro.
- Refutação: A ideia de que uma seita judaica previa o surgimento do cristianismo é especulativa. Embora o judaísmo do Segundo Templo incluísse diversas seitas apocalípticas, como os essênios, não há evidência concreta de que qualquer seita previu especificamente o surgimento do cristianismo ou a figura de Jesus. Os Manuscritos do Mar Morto, que Carrier menciona, contêm referências a uma figura messiânica, mas estas não podem ser diretamente ligadas a Jesus ou ao cristianismo nascente (veja “The Dead Sea Scrolls and the Jewish Origins of Christianity” de James VanderKam). O surgimento do cristianismo foi um fenômeno único, embora influenciado pelo judaísmo, e não uma continuidade automática de expectativas messiânicas anteriores.
Embora existam fragmentos de textos como os Manuscritos do Mar Morto que mencionam figuras messiânicas e esperanças escatológicas, não há evidência clara de que uma seita judaica anterior tenha previsto o cristianismo como ele se manifestou. Os Manuscritos de Qumran, por exemplo, não mencionam especificamente a figura de Jesus ou algo que corresponda ao movimento cristão primitivo. Além disso, o cristianismo primitivo emergiu em um contexto único que não foi antecipado pelas seitas judaicas conhecidas da época. Conforme o historiador Larry Hurtado, o cristianismo primitivo apresentava características inovadoras, como a veneração de Jesus como divino, algo sem precedentes dentro do judaísmo anterior .
Alegação 4: Os humanos são naturalmente inclinados a acreditar em mitos em vez da verdade, e isso explica a adesão ao cristianismo.
- Refutação: Esta visão reducionista da religião como meramente um mito é problemática e não leva em conta a complexidade da fé cristã e sua relação com a verdade histórica. Acadêmicos como N.T. Wright argumentam que a ressurreição de Jesus, que é o evento central do cristianismo, não pode ser explicada simplesmente como um mito. Em “The Resurrection of the Son of God”, Wright examina evidências históricas que sustentam a ressurreição e como os primeiros cristãos estavam profundamente convencidos de sua realidade. Reduzir o cristianismo a uma questão de mitologia ignora as motivações teológicas e históricas por trás da crença.
A visão de que Paulo modificou a mensagem original de Pedro e transformou o cristianismo em uma religião gentílica simplifica excessivamente o processo de desenvolvimento do cristianismo primitivo. Embora Paulo tenha desempenhado um papel crucial na expansão da fé para os gentios, ele se via como fiel às raízes judaicas da mensagem cristã. Paulo repetidamente enfatiza sua lealdade à tradição de Jesus (1 Coríntios 11:23, Gálatas 1:11-12) e reconhece a liderança de Pedro e dos outros apóstolos (Gálatas 2:7-9). Além disso, a decisão de aceitar gentios sem impor a circuncisão foi um consenso entre os líderes da igreja primitiva, incluindo Pedro, conforme registrado em Atos 15 .
Alegação 5: A maioria dos cristãos hoje não defende mais a verdade literal da Bíblia, mas sim a vê como um mito ou uma alegoria.
- Refutação: Embora seja verdade que há uma diversidade de opiniões entre os cristãos modernos sobre a interpretação da Bíblia, muitos cristãos continuam a defender a veracidade literal dos eventos centrais descritos nas Escrituras, como a morte e ressurreição de Jesus. Craig Keener, em sua obra “Miracles: The Credibility of the New Testament Accounts”, argumenta que o cristianismo primitivo e muitas comunidades cristãs contemporâneas continuam a ver os relatos bíblicos como eventos históricos literais, especialmente no que diz respeito à ressurreição. A afirmação de Carrier de que a maioria dos cristãos considera a Bíblia apenas como mito ou alegoria é uma generalização que ignora a realidade da crença cristã.
Alegação 6: A ciência cognitiva e a antropologia mostram que nossos cérebros são propensos a acreditar em falsidades, o que explica a persistência de religiões como o cristianismo.
- Refutação: Embora a ciência cognitiva de fato identifique vieses cognitivos que podem levar as pessoas a acreditarem em falsidades, isso não é suficiente para desqualificar o cristianismo como uma mera ilusão coletiva. Filósofos como Alvin Plantinga argumentam que o fato de nossos cérebros serem propensos a erros não significa que toda crença religiosa seja necessariamente falsa. Em seu livro “Where the Conflict Really Lies: Science, Religion, and Naturalism”, Plantinga demonstra que a crença em Deus pode ser racionalmente justificada, mesmo em um contexto de ciência cognitiva que reconhece limitações humanas.
Essa alegação ignora as tradições filosóficas e intelectuais antigas que já valorizavam o uso da razão e da lógica muito antes do surgimento do método científico moderno. Filósofos gregos como Sócrates, Platão e Aristóteles desenvolveram sistemas complexos de raciocínio lógico e ético, muitos dos quais foram adotados e adaptados por pensadores cristãos nos séculos seguintes. O próprio Agostinho, no século IV, argumentou pela compatibilidade da fé com a razão. O desenvolvimento do pensamento crítico não é um fenômeno exclusivamente moderno, mas parte de um legado mais amplo da filosofia ocidental .
Essas refutações oferecem uma visão mais equilibrada e fundamentada em fontes acadêmicas sobre as alegações de Richard Carrier.
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