Refutação do canal Verdades ocultas da Bíblia, mais um palpiteiro de Youtube.
1. Sobre as Cartas de Plínio, o Jovem
O vídeo critica o uso das cartas de Plínio, o Jovem, como evidência para a existência histórica de Jesus, alegando que Plínio não menciona Jesus diretamente, mas apenas os cristãos e sua adoração a Cristo. É importante contextualizar o que isso significa:
- Evidência Indireta: Embora Plínio não mencione Jesus diretamente, sua carta ao imperador Trajano (c. 112 d.C.) fornece evidências indiretas significativas para a existência de Jesus. Plínio descreve os cristãos como seguidores de “Cristo”, que é descrito como sendo adorado “como um deus”. O termo “Cristo” se refere claramente a Jesus de Nazaré, e a existência de uma comunidade estabelecida que o adorava tão cedo na história sugere fortemente a existência histórica de Jesus.
- Datação e Contexto: O argumento de que Plínio não foi contemporâneo de Jesus não invalida seu testemunho. De fato, muitos documentos históricos, incluindo os Evangelhos, foram escritos por pessoas que não eram contemporâneas de Jesus. Plínio, escrevendo no início do segundo século, reflete o crescimento e a disseminação do cristianismo, e sua carta é uma das primeiras menções fora do Novo Testamento que corrobora a existência de uma comunidade cristã organizada.
2. O Argumento da Ausência
O vídeo sugere que, porque Plínio não menciona especificamente o nome “Jesus”, não há prova de um “Jesus Histórico”. Esse argumento é problemático por várias razões:
- Natureza da Evidência Histórica: A ausência de menção direta a Jesus em uma carta que discute os cristãos não é surpreendente nem incomum. Plínio estava mais preocupado com as práticas dos cristãos e como lidar com eles do ponto de vista legal, e não com a história pessoal de Jesus. Muitas evidências históricas são indiretas, e o fato de Plínio mencionar seguidores de “Cristo” já é significativo.
- Outras Fontes Históricas: O testemunho de Plínio deve ser considerado junto com outras fontes históricas que mencionam Jesus, como os escritos de Tácito e Josefo. Tácito, por exemplo, escreve sobre Jesus em suas “Anais” (c. 116 d.C.), referindo-se à sua execução sob Pôncio Pilatos. Josefo, um historiador judeu do século I, também menciona Jesus em duas passagens diferentes de suas “Antiguidades Judaicas”, apesar de uma delas (o “Testimonium Flavianum”) ser objeto de debate quanto à autenticidade de certas partes.
3. Cristianismo e Gnosticismo
O vídeo faz uma alegação sobre o cristianismo praticado na época de Plínio ser “gnóstico”. É crucial entender o que é gnosticismo e como ele se relaciona com o cristianismo:
- Distinção entre Cristianismo e Gnosticismo: O gnosticismo é uma corrente filosófico-religiosa que se desenvolveu no início do cristianismo, mas não deve ser confundido com o cristianismo ortodoxo. A prática cristã descrita por Plínio, como entoar hinos a Cristo como se ele fosse um deus e abster-se de práticas imorais, é consistente com o cristianismo primitivo e não é uma evidência de gnosticismo. O gnosticismo, por outro lado, geralmente enfatiza um dualismo espiritual-material e a obtenção de conhecimento secreto para a salvação, o que não é mencionado nas cartas de Plínio.
- Mulheres como Ministras: A menção de mulheres como ministras no cristianismo primitivo por Plínio não é uma evidência de gnosticismo, mas sim de práticas e roles religiosos que existiam em diversas formas no cristianismo inicial. A presença de mulheres em posições de liderança ou como participantes ativas é documentada em outras fontes do cristianismo primitivo e não se limita ao gnosticismo.
1. Alegação de que Plínio, o Jovem, não menciona Jesus
Refutação: Plínio, o Jovem, em sua famosa Carta 96, realmente não menciona diretamente Jesus pelo nome. No entanto, a importância dessa carta não está em nomear Jesus especificamente, mas sim em fornecer evidências do cristianismo como um movimento religioso estabelecido no início do século II. Plínio descreve a prática dos cristãos de cantar hinos “a Cristo como a um deus”, o que, para historiadores, implica na adoração de uma figura histórica central ao cristianismo, ou seja, Jesus. A ausência do nome “Jesus” não nega sua existência histórica, mas reflete a prática comum de se referir a ele como “Cristo”, um título significativo que indica sua messianidade.
Fontes acadêmicas:
- Robert E. Van Voorst, Jesus Outside the New Testament: An Introduction to the Ancient Evidence (2000), p. 30-32.
- Larry Hurtado, Lord Jesus Christ: Devotion to Jesus in Earliest Christianity (2003), p. 54-55.
2. Alegação de que Plínio não era contemporâneo de Jesus
Refutação: De fato, Plínio viveu após a época de Jesus (61-114 d.C.), mas isso não invalida a relevância de seus escritos para o estudo do cristianismo primitivo. Muitos historiadores e acadêmicos consideram os escritos de Plínio como fontes valiosas para entender como o cristianismo foi percebido e praticado fora do contexto judaico inicial. A visão de Plínio reflete a disseminação do cristianismo e a sua transformação em uma religião distinta no Império Romano.
Fontes acadêmicas:
- Bart D. Ehrman, The New Testament: A Historical Introduction to the Early Christian Writings (6ª ed., 2016), p. 281-282.
- Paul Barnett, Jesus and the Rise of Early Christianity: A History of New Testament Times (1999), p. 293.
3. Interpretação de que o Cristianismo descrito por Plínio era Gnóstico
Refutação: A interpretação de que o cristianismo descrito por Plínio era gnóstico é problemática e carece de evidências textuais. O gnosticismo, como um movimento religioso, possui características específicas, incluindo uma visão dualista do mundo e um forte elemento de esoterismo. As práticas descritas por Plínio, como a adoração a Cristo e a observância de certos preceitos morais, são mais consistentes com o cristianismo ortodoxo primitivo do que com o gnosticismo. Além disso, o gnosticismo emergiu de forma mais clara no final do século II, e não há evidências robustas de que tenha dominado o cristianismo da época de Plínio.
Fontes acadêmicas:
- Karen L. King, What is Gnosticism? (2005), p. 93-95.
- David Brakke, The Gnostics: Myth, Ritual, and Diversity in Early Christianity (2010), p. 45-46.
4. O uso das fontes históricas para comprovar a existência de Jesus
Refutação: Fontes como Tácito, Suetônio e Plínio, embora não contemporâneas a Jesus, são frequentemente citadas por historiadores como evidências da existência de Jesus e do crescimento do cristianismo como movimento religioso. Tácito, por exemplo, menciona a execução de Cristo sob Pôncio Pilatos em seus Anais (15.44), o que é amplamente considerado uma referência independente à crucificação de Jesus, confirmando a narrativa dos Evangelhos.
Fontes acadêmicas:
- James D. G. Dunn, Jesus Remembered (2003), p. 141-145.
- Gary Habermas, The Historical Jesus: Ancient Evidence for the Life of Christ (1996), p. 189-191.
4. Conclusão
A análise apresentada no vídeo parece simplificar excessivamente as questões históricas e falha em considerar o contexto mais amplo das evidências. Plínio, o Jovem, mesmo não mencionando Jesus pelo nome, oferece um testemunho valioso sobre a existência e práticas de uma comunidade que reconhecia Jesus (Cristo) como uma figura divina, apenas poucas décadas após sua morte.
Portanto, as cartas de Plínio, juntamente com outras evidências de historiadores romanos e judeus, e os próprios escritos cristãos, compõem um quadro coerente e robusto para a existência histórica de Jesus. A tentativa de descartar essas evidências com base em detalhes técnicos ou na ausência de menção direta não reflete a prática acadêmica rigorosa de análise histórica.
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