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A cruz e o arco-íris – I

aA luta política por direitos homossexuais é um movimento recente no mundo, mas não é fruto direto de discordâncias sociais sobre a prática, pois certa oposição esse comportamento sempre enfrentou. Temos que associar isso à ideia do surgimento de uma classe específica que se identificou de acordo com sua sexualidade. Ou seja, o movimento político gay não começou tão somente como um movimento contrário a ideologias que condenavam as práticas homossexuais, pois se assim fosse, teria surgido bem anteriormente na história da humanidade.

De acordo com o filósofo Michel Foucault os termos “homossexual” e “gay” não são sinônimos. Ambos são construções históricas com épocas e sentidos distintos. Essas categorias são recentes na história da humanidade. Isso não significa que não houvessem relações homoeróticas antes do surgimento dessas categorias. O fato é que a partir de 1870 através de um artigo denominado “As sensações sexuais contrárias” veio a existir a categoria conhecida como homossexual. Antes a homossexualidade não existia como categoria, era apenas algo que alguém havia cometido. Não existia essa ideia moderna de separar a humanidade por orientação sexual.

O termo homossexual veio imposto por outros, não eram os homossexuais que se denominavam assim. Não havia uma organização quanto a isso. A homossexualidade era uma categoria que tinha existência externa e não possuía ligação direta com determinado grupo humano. Ao praticar o ato homoerótico o indivíduo fazia jus a essa categoria. Entretanto, não havia ideologicamente o seu oposto, a categoria ideológica conhecida como heterossexual. O modelo de disputa ideológico entre heterossexuais e homossexuais surgiu da mesma maneira como o embate entre socialismo e capitalismo. São frutos de disputas políticas e ideológicas. Tanto a heterossexualidade como o capitalismo existiram durante séculos sem serem denominadas como ideologias. Nesse sentido o movimento moderno gay criou um monstro imaginário com o qual luta bravamente. Com certeza um enredo digno de Cervantes.

O movimento moderno gay surgiu nos meados dos anos 1960, no auge do movimento de liberação sexual juntamente com o movimento feminista. O termo gay que significa “alegre” em inglês foi adotado por pessoas como uma forma de protesto com o intuito de uma libertação da heteronormatividade. O termo gay é totalmente político e uma questão de orgulho para a categoria. Toda a noção de pecaminosidade e patologia que antes eram associadas aos homossexuais foram sendo retiradas com a nova nomenclatura. Se antes eram os outros que os rotulavam como homossexuais de um ponto de vista pejorativo, agora eram eles próprios que tomavam as rédeas e se declaravam como uma subclasse da humanidade, porém, uma classe política numa luta contra essa visão de que seus comportamentos sexuais era algo doentio. O termo gay circunscreveu mais ainda a categoria homossexual. Reduzindo-os unicamente a sua sexualidade. A homossexualidade não era mais um detalhe e sim o motivo principal, a característica única que os identificavam. Era algo que unia. Formou-se então um nicho social, uma categoria antropológica.

Primeiro se distinguiram e se identificaram como uma classe e depois buscaram direitos. Michael Foley em seu livro “A era da loucura” assinala:

A identidade pode ser encontrada no dinheiro, no status ou na celebridade, mas é mais facilmente conferida pelo sentimento de pertencer a um grupo – em geral baseado em etnia, raça, religião ou orientação sexual. O grupo será especialmente atraente se puder alegar ter sofrido injustiça. Então seus membros podem ser vítimas e desfrutar o luxo de ter quem culpar .

O movimento gay tem se empenhado fortemente em destruir as bases da sociedade, principalmente contra valores religiosos. Foucault, que era homossexual afirmou que o movimento gay não deve copiar o modelo heteronormativo. Para ele os gays não deveriam apenas desejar serem aceitos pela sociedade, mas aproveitar a situação para transformar a estrutura social de uma maneira muito mais ampla. Segundo os lideres do movimento é a igreja a responsável pela homofobia crescente.

Mas será mesmo que a igreja é a responsável pela homofobia? Afirmarmos que a homossexualidade não é correta, mas há um abismo enorme entre dizermos que isso é errado e alguém assassinar um homossexual motivado por ódio. Daniel Borrillo, pesquisador argentino e autor do livro: Homofobia: história e crítica de um preconceito, afirma em sua obra que:

A homofobia é uma manifestação arbitrária que consiste em designar o outro como contrário, inferior ou anormal; por sua diferença irredutível, ele é posicionado a distância, fora do universo comum dos humanos.

Sua crítica estende-se a cultura judaico-cristã como responsável por esse tipo de pensamento que fez com que vingasse a ideia em nossa sociedade de que tratamos o homossexual como desumano, diferente e como “o outro”. Precisamos deixar claro que o cristianismo não admite a prática homoerótica, mas nunca trata alguém como diferente no sentido de colocá-lo fora da natureza na tentativa de distanciá-los propositalmente. O mal entendido se baseia na equiparação entre cristãos e gays. Acreditam, por mau entendimento teológico que o cristianismo os coloca numa posição rebaixada, que a equiparação cristã é feita por cima, e deduzem disso que os cristãos os enxergam como inferiores. Quando na verdade, no cristianismo somos todos equiparados por baixo. Todos somos pecadores, não há um justo sequer. Não colocamos os homossexuais fora da natureza, ao contrário, nos colocamos juntamente com eles na natureza decaída. Se de fato existe uma separação, isso ocorre pelo fato de determinadas pessoas reclamarem para si o direito à existência como grupo social se caracterizando única e exclusivamente por suas preferências sexuais. Se querem alegar que o comportamento é aceitável e normal, não devem se segregar usando como motivação o mesmo motivo pelo qual querem a normalização. O erro é estratégico e contraditório. Como nos alerta Foley:

Outro problema da “celebração da diversidade” é que ela visa promover a inclusão, mas muitas vezes promove o oposto: a separação. Os grupos que se sentem privados de direitos culpam os outros grupos e exigem ser separados deles […] mas o separatismo, em vez de abrandar a divisão, a reforça e a exacerba […] O separatismo causa os problemas que deveria prevenir, que então são usados como prova de intolerância que antes motivou a separação, tornando a separação ainda mais hostil.

Não são os cristãos que os rotulam como diferentes. A comunidade gay assumiu para si uma postura de se reduzirem apenas a um instinto sexual criando suas próprias mazelas. O feitiço virou contra o feiticeiro. Os cristãos não os tratam como algo fora da natureza, essa é uma ideia má compreendida da doutrina cristã. Funciona justamente ao contrário. Todo ser humano é igualmente parte da natureza e que devido ao pecado original está deturpada, logo todos necessitam da graça de Deus.

A grande e talvez não tão óbvia contradição interna do movimento reside em ter como base uma filosofia que não oferece base alguma. Primeiro abrem mão de normas morais sexuais, mas para isso é preciso abolir a moral cristã. E o caminho para isso é abolindo a religião. O ateísmo é o caminho necessário para alcançar tal fim. Depois de conseguido tal feito a coerência social vai pro espaço. Daí surge inconsistências como a tão acalorada ideia de que todos devemos ser absolutamente tolerantes com certas práticas. E intolerantes com quem discorde. Qualquer menino que foi bem instruído em lógica perceberá a aberração de tais afirmações. Se rompermos com o dogma da moralidade objetiva e da verdade absoluta abriremos mão da própria lógica. Se tudo cai no relativismo de valores, na verdade significa que não há valor algum. Tudo o que resta são subjetivações sentimentais. Um amontoado de afirmações amorfas destituídas de sentido e coerência. Se não há um modelo de verdade absoluta a ser copiado ou seguido inventaremos os nossos próprios de acordo com nossos interesses pessoais. Se tudo cai na relativização, os valores logo se tornam inexistentes ou rarefeitos.

A violência é fruto da relativização de valores. O mal tomado como bem. Não estou negando a existência de leis que vão contra essas práticas, mas que leis não são suficientes se essas não são absolutas. Se não existe um modelo de lei supremo e exterior ao homem, dificilmente esse homem respeitará a lei na ausência de outras pessoas. Ao tirarem o valor supremo das normas de Deus o ser humano precisa criar um modelo artificial que se assemelhe a esse valor absoluto. Segundo os filósofos contratualistas, assim surge o Estado: todos os homens abrem mão dos seus direitos de fazerem justiça pelos seus próprios meios, e delegam esse direito a uma única coisa, no caso o Estado. Somente o Estado tem o poder de julgar e punir uma pessoa. Porém esse modelo é falho, pois o Estado sempre será dirigido e representado por homens, e estes poderão criar leis que os privilegiem, e ainda assim causará outro problema social, pois se o poder pode ser exercido por um representante do Estado, e esse representante é um ser humano, logo qualquer cidadão na condição de homem (ser humano) poderá exercer a mesma função. O que levará a uma disputa eterna entre os homens para alcançar esse poder. O caos continua. O problema da justiça plena fica difícil de ser resolvido se não há uma instância objetiva e externa aos homens. Por isso a necessidade de um legislador moral absoluto. Por isso se não existe Deus e nem a eternidade, tudo se torna permissível. Se não há Deus e a eternidade a vida humana não tem valor intrínseco, matar alguém deixa de ser visto como errado. O Estado nunca terá o controle total sobre isso se não recorrer a uma instância exterior aos homens.

No Brasil o problema se agrava. Sérgio Buarque há algumas décadas teorizou sobre o famoso jeitinho brasileiro. O certo tomado como útil, o privado se impondo ao público. Já dizia Gérson, ex-jogador da seleção brasileira de futebol em um comercial de tv na década de setenta: “o importante é levar vantagem em tudo”. A frase ficou conhecida como lei de Gérson, e mostra com clareza o famoso jeitinho pragmático brasileiro, que prega o desrespeito pelas leis quando o objetivo é levar vantagem pessoal. As canalhices dos detentores do poder assim perpetuam essa natureza, esse “patrimônio cultural brasileiro”. Se o Brasil é considerado um país homofóbico com certeza não o é devido à religião. O brasileiro é um povo altamente crédulo, mas pouco religioso no sentido mais amplo e verdadeiro da palavra.

Não tenho dúvidas de que não é a Igreja a responsável pela violência contra homossexuais. Pois o cristianismo não prega apenas a condenação da prática, mas acima de tudo o amor e o respeito ao próximo. Não é a presença de uma religiosidade exacerbada na sociedade a causa responsável pela violência contra gays, e sim o oposto: a ausência de valores cristãos absolutos. Infelizmente alguns líderes gays levantam a bandeira da guerra contra o que chamam de “fundamentalismo religioso”. Entendem por fundamentalista qualquer cristão que discorde da prática homossexual. Confundem mais uma vez as coisas, pois todo cristão que se preze deve discordar desta prática. O ato de discordar não é ato de violência. A igreja não é homofóbica nos moldes como a comunidade gay pinta. Não saímos por ai caçando gays com tochas. Há exceções, mas se é exceção é porque não é um cristão verdadeiramente e não é sobre estes que estou me referindo. Vivemos numa sociedade que se baseia em boatos, ninguém se interessa em checar as fontes das informações e em pesquisar sobre o que está sendo falado. A internet tem sido o principal areópago de besteiróis da nossa era moderna. “Religião é algo violento”, este tem sido o principal dogma da sociedade que despreza os dogmas.

Por Eliel Barberino

2 comentários em “A cruz e o arco-íris – I”

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