Em um encontro na Pontifícia Academia de Ciências, o papa João Paulo II comentou sobre evolução e reconheceu o progresso da ciência em explicar as origens da vida e o processo de criação. Mas o papa também sublinhou a compatibilidade da evidência científica com as verdades da fé, e da ciência com a teologia: “A consideração do método usado em diversos campos do conhecimento permite a concordância de dois pontos de vista que parecem inconciliáveis. A ciência da observação descreve e mede com grande precisão as múltiplas manifestações da vida enquanto a teologia obtém o significado final, conforme os propósitos do Criador.” Antes de focar na questão específica da evolução, primeiro faremos uma abordagem da criação no Gênesis e as verdades de fé que encontramos ali reveladas.
Devemos lembrar que o Gênesis não teve o propósito de ser uma explicação científica de como a criação ocorreu. Os primeiros três capítulos do Gênesis que definem a criação, a queda do homem, e a promessa da salvação não pretendem ser um texto de física ou biologia que dê uma compreensão científica da humanidade e do mundo. Diferentemente, a versão do Gênesis sobre a criação é um trabalho de teologia que tem o foco sobre quem, por quê e o quê da criação. Escrito em séculos antes do nascimento do nosso Senhor, os inspirados autores sagrados sob a guia do Espírito Santo teceram uma história para capturar as verdades de Deus e Suas criações. Sendo que Abraão viveu em aproximadamente 1850 a.C., as histórias do Gênesis foram provavelmente preservadas oralmente por séculos até que começassem a ser produzidas na forma escrita.
Para apreciar a beleza e a significância do tratado do Gênesis, devemos examinar as culturas pagãs próximas ao povo Judeu. Eles viveram entre essas várias culturas, cada qual tendo sua própria religião e portanto suas próprias histórias sobre a criação. Como exemplo, os Babilônios tinham uma história chamada Enuma Elish. Nessa as deidades Apsu (masculino) e Tiamat (feminina) tiveram outro deus chamado Ea, quem por vez teve um filho chamado Marduke. Ea matou Apsu, e Marduke então matou Tiamat. Dos restos de Tiamat, Marduke criou o mundo. Marduke também matou Kingu, o conselheiro de Tiamat, e com seu sangue, criou a humanidade.
O culto Egípcio do Sol baseado na cidade de Heliopolis descreveu como Amon-Re (ou Ra), o Deus Sol, nasceu de Nun, as águas do caos. Amon-Re então inseminou-se por masturbação divina e ejaculou Shu (o ar) e Tefnut (umidade), dando-lhes força vital ou Ka. Shu e Tefnut então criaram Geb (terra) e Nut (céu), e outros deuses. Essa mesma história conta sobre como os humanos foram criados das lágrimas caindo dos olhos de Amon-Rá.
Outros cultos religiosos egípcios tiveram outras histórias de criação. O culto em Mênfis conta sobre como o deus Ptah concebendo em seu coração e falando com sua língua criou todos os seres vivos. O culto a Elefantina descreveu o deus Khnum como um modelador criando todos os seres vivos numa roda de artesão do barro. Assim, alguns elementos dessas histórias são similares a outros encontrados no Gênesis, já a diferença entre essas histórias e Gênesis é grande. Dê uma boa olhada à primeira consideração do Gênesis à criação, 1,1-2.4. Aqui encontramos um onipotente, onisciente, amoroso, eterno e infinito Deus. Ele cria livremente conforme Seu divino conhecimento e é motivado por amor genuíno.
Deus cria todas as coisas do nada (ex nihilo), criando até mesmo aquilo do que é feita a criação. Mas, Ele é distinto de sua criação. Os textos hebraicos usam a palavra bara para “criação”, e essa palavra é usada somente para a ação de Deus no mundo. O objeto criado é sempre algo novo, maravilhoso e impressionante. A palavra criativa de Deus não é somente pessoal, responsável e eficaz, mas também dá vida.
No Gênesis, Deus cria de maneira muito ordenada, conforme um plano de sete dias. O número sete foi considerado um número perfeito para os judeus. Apesar de a palavra dia normalmente significar um período de 24 horas, pode ser também usado para uma temporada, um tempo ou evento particular (exemplo: “dia do julgamento”) ou um período de tempo. Devemos lembrar que Deus é infinito e por isso não é determinado por tempo. Consequentemente, no Gênesis, dia e a sequência de sete dias se referem mais a um designado, proposital intervalo de tempo sobre o qual Deus cria.
Apesar de não ser uma questão científica, o desdobramento da criação segue um plano divino que tem um sentido lógico em uma perspectiva humana. Mais importante, no fim de cada dia, Deus olha a criação e a reconhece como muito boa. Esse ponto sobre a bondade da criação é enfatizado repetidamente para refutar qualquer noção de que o mundo material é mau, corrupto ou depravado, como algumas culturas ou cultos pensam.
Ainda mais, o Gênesis tem o clímax com a criação do homem e da mulher: “Deus criou o homem à Sua imagem; na imagem divida Ele os criou; homem e mulher Ele os criou” (1,27). Esse verso bonito enfatiza que somente o homem e a mulher refletem a imagem e similaridade de Deus. Dessa crença, nós cremos que Deus criou e deu a cada um de nós uma única e imortal alma.
Imediatamente, podemos ver as diferenças entre Gênesis e as explicações sobre a criação das culturas próximas. Gênesis não tem a geração de nenhum deus ou deuses; no Gênesis, Deus é eterno. Em outras culturas, criação é o produto de atividade sexual divina, brigas por poder, assassinatos, acidentes e caprichos; No Gênesis, Deus cria através de sua eterna Razão – Sua Palavra – e Sua criatividade tem ordem, desígnio, unicidade e propósito. Diferente de outras histórias de criação, o Gênesis enfatiza um Deus amoroso que criou livremente todas as coisas boas, e criou a humanidade à Sua imagem e semelhança, dotando-os de uma única alma imortal. O Deus de Gênesis não é parte da criação; Em vez disso, ele transcende a criação, mas é presente para levantar e manter a criação que é boa aos Seus olhos. Finalmente, não devemos esquecer que toda a criação – a história completa do Velho Testamento – se move rumo a Cristo e deriva seu real significado de Cristo através de quem todas as coisas foram criadas e quem reconciliou todas as coisas em Sua pessoa (Colossenses 1,15-21).
Dada essa compreensão do Gênesis, em artigos posteriores iremos determinar as questões da ciência e sua compatibilidade com essas verdades da fé.
Fonte: http://catholiceducation.org/articles/religion/re0215.html
Tradução: Carlos Estevam