A imprensa está cheia agora com alegações de que o papa Francisco tomou uma linha acentuadamente diferente do que o seu predecessor, o Papa Bento XVI, sobre o tema da homossexualidade.
Alguns estão sugerindo que o novo papa anunciou que “ser gay é bom”. O que realmente o papa Francisco disse, e como isso é incomum?
Aqui estão 7 coisas para saber e compartilhar. . .
1) Onde foi que o papa Francisco fez essas observações?
Ele as fez durante uma entrevista de 80 minutos com os jornalistas a bordo do avião voltando de Jornada Mundial da Juventude no Brasil.
2) O que lhe perguntaram que o levou às observações?
Podemos não saber exatamente qual foi a pergunta até que uma transcrição seja liberada mas, aparentemente, ele foi questionado sobre a questão do “lobby gay” no Vaticano.
Mais informações sobre isso aqui.
3) O que exatamente ele disse?
De acordo com os melhores relatos correntes, ele disse:
Há muita conversa sobre o lobby gay, mas eu nunca vi isso no cartão de identificação do Vaticano.
Quando eu encontro uma pessoa gay, tenho que distinguir entre o seu ser gay e ser parte de um lobby. Se eles aceitarem o Senhor e terem boa vontade, quem sou eu para julgá-los? Eles não devem ser marginalizados. A tendência [isto é, a atração pelo mesmo sexo] não é o problema … eles são nossos irmãos.
ATUALIZADO: Aqui está uma apresentação mais completa da entrevista. Veja o original aqui!
A pergunta de Ilze Scamparini ao Papa Francisco, jornalista no vôo papal
Ilze: Eu gostaria de pedir permissão para colocar uma questão bastante delicada. Outra imagem que deu a volta ao mundo é a do Monsenhor Ricca e as notícias sobre sua vida pessoal. Eu gostaria de saber, sua Santidade, o que vai ser feito sobre esta questão. Como se deve lidar com essa questão e como é que Vossa Santidade deseja lidar com toda a questão do lobby gay?
A resposta do papa
No caso de Mons. Ricca; eu fiz aquilo que o Direito Canônico manda fazer, ou seja, a investigatio previa. E, a partir desta investigatio, não há nada de quanto o acusam, não encontramos nada sobre isso. Esta é a resposta. Mas eu queria acrescentar mais uma coisa sobre isso: eu vejo que muitas vezes na Igreja, fora deste caso e também neste caso, vão-se procurar, por exemplo, os «pecados de juventude» e isso é publicado. Não se trata de delitos, atenção; os delitos são coisa diferente: o abuso de menores é um delito. Não se trata disso, mas de pecados. Ora, se uma pessoa – leigo, sacerdote ou religiosa – cometeu um pecado e depois se converteu, o Senhor perdoa; e quando o Senhor perdoa, o Senhor esquece. E isso é importante para a nossa vida. Quando vamos nos confessar e dizemos, com verdade, «eu pequei nisto», o Senhor esquece e nós não temos o direito de não esquecer, porque corremos o risco de que o Senhor também não se esqueça dos nossos [pecados]. Isso é um perigo. Isso é importante: a teologia do pecado. Muitas vezes eu penso em São Pedro: fez um dos piores pecados, que é renegar a Cristo, e com este pecado Cristo o fez Papa. Devemos pensar muito.
Mas, voltando à sua pergunta mais concreta: neste caso, eu fiz a investigação previa e nada encontramos. Esta era a primeira pergunta. Depois, você falava da lobby gay. Bem! Escreve-se muito sobre a lobby gay. Eu ainda não encontrei ninguém com o bilhete de identidade no Vaticano dizendo que é «gay». Dizem que há. Eu acho que, quando alguém se encontra com uma pessoa assim, deve distinguir entre o fato de que uma pessoa seja gay e o fato de formar uma lobby, porque as lobby nem todas são boas. Isso é mau. Se uma pessoa é gay e procura o Senhor e tem boa vontade, quem sou eu para a julgar? O Catecismo da Igreja Católica explica isso muito bem, dizendo – esperem um pouco… como diz… -: «Não se devem marginalizar estas pessoas por isso, devem ser integradas na sociedade».
O problema não é ter essa tendência, não; devemos ser irmãos, porque este é apenas um; mas se há mais outro, outro. O problema é fazer lobby dessa tendência: lobby de gananciosos, lobby de políticos, lobby dos maçons, tantas lobby. A meu ver, este é o problema mais grave. E lhe agradeço muito por ter feito esta pergunta. Muito obrigado!
Original italiano na ligação .
4) O que isso significa?
A primeira parte da afirmação parece minimizar a questão do “lobby gay”. Ele não está negando que isso exista, mas ele está sugerindo que a conversa é um pouco exagerada. Em seguida, ele explica a sua abordagem para lidar com os gays: ele faz uma distinção entre o “ser gay” e “fazer parte de um lobby”. O que ele quer dizer com “ser gay” é algo que ele depois esclarece.
Na linguagem comum, “ser gay” pode significar qualquer coisa desde ter atração pelo mesmo sexo e ter um “estilo de vida gay” ativo até endossar e defendender uma ideologia pró-homossexual. Este último seria fazer parte de um lobby, e ele indica que não é isso do que ele está falando. Ele então descreve aqueles dos quais está falando como as pessoas que “aceitam o Senhor e têm boa vontade.” Ele, então, parece esclarecer que ele está falando, dizendo que “a tendência [isto é, a atração pelo mesmo sexo] não é o problema … eles são nossos irmãos.”
Tomando suas declarações em conjunto, o que surge é um retrato de pessoas que têm atração pelo mesmo sexo, mas que, no entanto, aceitam o Senhor e têm boa vontade, em vez de trabalhar para promover uma ideologia pró-homossexual. Isso iria incluir as pessoas com atração pelo mesmo sexo que se esforçam por viver a castidade (mesmo que às vezes não). Também, possivelmente, poderia incluir pessoas que não vivem castamente, mas que não estão promovendo um lobby e uma agenda homossexual. Seria bom se ele tivesse dito um pouco mais para esclarecer o ponto.
5) O que ele diz sobre as pessoas nesta categoria?
Ele diz que não acha que ele está em uma posição para julgá-las e que elas não devem ser marginalizadas. Ele também diz que a mera tendência (atração pelo mesmo sexo) “não é o problema”, e que “eles são nossos irmãos.”
6) Tem algo de novo nisso?
Não muito. Negar o direito de “julgar” os outros é algo que remonta a Jesus. Isso não significa uma falha em reconhecer o caráter moral das ações dos outros. Pode-se formar uma avaliação moral que o que alguém está fazendo é errado (Jesus obviamente não proíbe isso) sem ter ou mostrar malícia em direção a elas.
A afirmação de que eles não devem ser marginalizados está igualmente de acordo com a abordagem da Santa Sé para o assunto, em um documento de 1986 do Vaticano sobre o atendimento pastoral das pessoas homossexuais. A afirmação de que a atração pelo mesmo sexo “não é o problema”, quando compreendida corretamente, também não é novidade. “O problema”, como o Papa Francisco parece aqui entendê-lo, vai além de simplesmente ter uma tendência pecaminosa – uma tentação a que se está sujeito.
Obviamente, as tentações são um problema, mas se resistimos à tentação não pecamos. “O problema”, à base nesse entendimento, está em cair na tentação e pecado ou – pior – a construção de uma ideologia de todo o pecado e tentar defender o pecado. Finalmente, a afirmação de que “eles são nossos irmãos” também não é novidade. Os cristãos, como todos, têm lutado com toda a espécie de tentação por toda a história.
A atração pelo mesmo sexo é apenas uma tentação entre muitas outras, eo fato de que uma pessoa sofre com esta tentação não a priva do status de ser um irmão em Cristo mais do que qualquer outra tentação.
7) Como estas declarações são diferentes das do Papa Bento?
A imprensa (como de costume) tenta fazer comparações desfavoráveis ao Papa Benedito, lembrando que durante seu mandato, a Santa Sé emitiu um documento dizendo que as pessoas com tendências homossexuais profundamente arraigadas não devem ser ordenadas para o sacerdócio. O papa Francisco não mencionou esse documento ou a sua política e por isso não fez nada diferente do que Bento pronunciou.
Nenhuma das observações de Francisco vai de encontro à abordagem que Bento tomou durante o seu pontificado. Na verdade, o próprio Bento (como cardeal Joseph Ratzinger) foi o signatário da mencionada Carta sobre a cura pastoral das pessoas homossexuais, bem como o documento de acompanhamento de não-discriminação em relação a pessoas homossexuais .
Então, como de costume, a imprensa está pintando um quadro falso, contrastando o “bom” Francisco e o “mau” Bento.
ADENDO:
A visão latinoamericana é sempre mais flexível em relação aos valores morais. Somos, por assim dizer, mais condescendentes, menos afeitos à rigidez. Há um risco muito grande, portanto, quando olhamos o mundo a partir exclusivamente do nosso ponto de vista.
Parece-me que o Papa Francisco sofre um pouco desse mal vezo. Ao falar de modo flexível sobre temas caros à moral católica, como o aborto, por exemplo, que é a expressão mais eloquente do desrespeito à vida (que, intrauterina, não tem a possibilidade de autodefesa), o Papa passa uma ideia perigosa de sinal trocado, invitando a que, na vida privada, as pessoas deixem de fora justamente os preceitos religiosos que deveriam fazer vida e sob os quais deveria pautar os seu atos.
Ao Papa é dado ser luz para os católicos e não-católicos. Mostrar acolhimento e compreensão aos pecadores (entre os quais todos nos incluímos como dado de fé; todos precisamos do gesto salvífico de Cristo na cruz!). Nada obstante, em temas morais, a flexibilidade que se pode conceder nos casos individuais, conforme as circunstâncias concretas, não corresponde àquela defendida como princípio universal. Exemplificando: a Igreja não admite relações homoafetivas, por princípio, porque o casamento é um sacramento destinado a homem e mulher. Não poderia a Igreja, sem trair o Evangelho, adotar sacramentalmente a união entre pessoas do mesmo sexo. É algo que refoge à moda, que pertence à palavra de Deus. A Igreja não pode dispor dos tesouros da fé, sendo apenas a sua guardiã. Esse é o princípio universal da moral católica.
Isso, contudo, não implica em rejeitar os homossexuais. A Igreja pode até acolher casais homoafetivos que vivam uma relação sincera de amor, porém com acompanhamento pastoral e dentro de limites precisos: trata-se de uma relação que impede a vida sacramental, como ocorre, por exemplo, com os casais de segunda união. É dizer, a Igreja acolhe os seus filhos, porém sem abrir mão dos pontos cardinais da moral católica, baseada na tradição oral e escrita.
É disso que o Papa Francisco fala, porém sem a necessária prudência de pastor do povo de Deus. Expõe uma flexibilidade admitida diante de situações concretas como princípio universal, o que é grave erro em um mundo sem um eixo de valores seguros em que vivemos. Cabe à Igreja o duro papel de ser luz do mundo e sal da terra; cabe à Igreja de Cristo a dura missão de pregar a palavra de Deus, mesmo quando nos recusamos a ouvi-la. Não foi assim, ao seu tempo, com Jeremias? (Jer 1,5-9: “Antes mesmo de te formar no ventre materno, eu te conheci; antes que saísses do seio, eu te consagrei. Eu te constituí profeta para as nações. Mas eu disse: “Ah! Senhor Iahweh, eis que eu não sei falar, porque sou ainda uma criança!” Mas Iahweh me disse: Não digas: “Eu sou ainda uma criança!” Porque a quem eu te enviar, irás, e o que eu te ordenar, falarás. Não temas diante deles, porque eu estou contigo para te salvar, oráculo de Iahweh. Então Iahweh estendeu a sua mão e tocou-me a boca. E Iahweh me disse: Eis que ponho as minhas palavras em tua boca.”).
Esse é o papel da Igreja: proclamar profeticamente a palavra de Deus. Ainda quando o mundo a rejeite. Ainda quando grupos de pressão a ataquem. Ainda quando os cristãos sejam perseguidos. Se a Igreja for pop, por certo estará traindo o Cristo Jesus. Ele que não foi pop, não veio para fazer sucesso e ser compreendido. Ele não quis se fazer compreender; quis antes de tudo converter.
Falo sobre mim. Dou o meu testemunho. Em minha privada tenho falhado em face desses princípios da moral católica. Isso não me autoriza, porém, a dobrá-la à minha vontade, à minha conveniência. Já dizia o Senhor, através da boca de Isaías: “Com efeito, os meus pensamentos não são os vossos pensamentos, e os vossos caminhos não são os meus caminhos, oráculo de Iahweh.” (Is 55, 9 ). Cumpre-me, então, sinceramente arrepender-me e buscar adequar a minha vida à palavra de Deus. É fácil? Evidente que não! Já o dizia São Paulo aos Romanos (Rm 7,19-20): “Com efeito, não faço o bem que eu quero, mas pratico o mal que não quero. Ora, se eu faço o que não quero, já não sou eu que estou agindo, e sim o pecado que habita em mim”.
A Igreja que amo é a Igreja de Cristo! Não a igreja que que busca estar cheia, não a igreja que se converte ao mundo ou apregoa milagres a torto e a direito. A Igreja de Cristo é aquela que proclama a sua palavra e que a preserva, mesmo sendo incompreendida. Por isso, penso que o Papa Francisco, com a sua doce humildade, não pode dar sinais dúbios em matéria de fé e em matéria moral, porque pesam sobre os seus ombros dois mil anos de história e bilhões de fiéis.
Amo Francisco, como meu pai na fé. É um sinal de humildade e pobreza. Mas há de ser também um sinal eloquente da fé católica em um mundo que não se cansa de dizer não a Deus. (Fonte)
Fonte: http://www.ncregister.com/blog/jimmy-akin/7-things-you-need-to-know-about-what-pope-francis-said-about-gays
Tradução: Emerson de Oliveira